segunda-feira, 6 de março de 2017

Verão Quente

VERÃO QUENTE

A memória tem destas coisas. 

Lembro-me também das operações stop do MFA. Mal o carro parava começava a gritar “O Povo está com o MFA!”.

Lembro-me que eles riam e faziam o “V” com os dedos. Numa mesma viagem chegávamos a parar duas e três vezes. Eram uma festa!...

Uma vez um militar do MFA assinou no vidro do carro para que os seus camaradas soubessem que este já tinha sido revistado. Fiquei lixado... não íamos parar mais nessa viagem!

Mais tarde, depois do sonho lindo acabar, numa operação stop de rotina, comecei a gritar que o Povo está com o MFA. Só mais crescidito percebi a aflição do meu pai a mandar-me calar e o ar carrancudo da GNR!

Lembro-me que de cada vez que arrancávamos de um sítio para outro, ouvíamos na rádio a notícia de um atentado bombista, ou de qualquer outro acto de violência, no sítio de onde saíamos.

Estas memórias fizeram pesquisar o que existem na “net” sobre este Verão. Já encontrei algumas coisas...

Mas espero encontrar mais. Mas isso fica para quando houver mais tempo...

Cronologia de acções terrorista 

26/05/75 - Violência anticomunista. Ataque a sede do MDP em Bragança

03/06/75 - Atentados bombistas da direita, em Lisboa.

19/06/75 - Rebenta bomba junto da Igreja da Graça em Lisboa.

13/07/75 - Violência anticomunista. Começa a escalada de assalto a sedes de partidos de esquerda, com a destruição das sedes PCP e da FSP em Rio Maior.

21/07/75 - Assalto a sedes do PCP em Estarreja, Aveiro, Castelo Branco, Oliveira de Azeméis e Campanhã. Bomba destrói radiofarol em Vilar Formoso. Destruída sede do MDP e sala da câmara em Matosinhos.

16/08/75 - Violência anticomunista. Boicote a comício do PCP em Alcobaça. Incidentes em Braga no fim de um comício do MRPP. Bombas contra sede do MES em Vila Nova de Gaia. Assalto a sede do PCP em Algoz.

26/08/75 - Assaltos em Leiria (MDP), Porto, na Areosa (PCP), Peniche (PCP) e bomba na FSP em Lisboa.

27/08/75 - Assaltos em Leiria (LCI e FEC) e Esmoriz (PCP)

31/08/75 - Assalto em Cinfães (MDP). Atentado bombista contra a Emissora Nacional na Madeira.

07/09/75 - Violência anticomunista. Bomba na Efacec em Matosinhos.

15/09/75 - Violência anticomunista. Explosões na Emissora Nacional da Guarda. Tentativa de assalto ao RCP de Miramar.

20/09/75 - Violência anticomunista. Bombas na Batalha

21/09/75 - Bomba na messe da Marinha em Cascais onde dormia Pinheiro de Azevedo

21/09/75 - Violência anticomunista. Bombas no Porto e em Leiria.

22/09/75 - Bomba contra sede do PCP na Marinha Grande

24/09/75 - Bomba contra sede do PCP em Vieira do Minho e na E. Nac. De Bragança

25/09/75 - Violência anticomunista/ Terrorismo de Direita. Bombas num automóvel em Monsanto. Morte de três elementos de um comando do ELP que tentavam fazer explodir antena da RTP.

09/10/75 - Atentado contra sindicalista em Montoito

09/10/75 - Bombas contra MDP e delegação do ministério da agricultura em Mirandela

10/10/75 - Atentado contra militante do PCP em Elvas

10/10/75 - Violência de Direita. Bombas em Lagos e Viana do Castelo

15/10/75 - Bomba contra militante do PCP em Fafe. No Porto contra sede da LCI. Em Elvas contra a Estação de Melhoramento de Plantas.

16/10/75 - Bomba em Alcácer do Sal contra instalações do ministério da agricultura

17/10/75 - Bomba anticomunista em Melgaço

18/10/75 Incendiada sede da UDP no Porto

21/10/75 - Bomba contra livraria comunista no Porto.

23/10/75 - - Violência anticomunista. Tiros em Lisboa contra viatura do RALIS

25/10/75 - Terrorismo de Direita/Violência anticomunista. Cinco bombas em Lisboa contra carros de militares de esquerda

25/10/75 - Violência anticomunista. Bomba contra a Editorial Inova do Porto

29/10/75 - Bombas contra militante do PCP no Porto.

30/10/75 - Bomba anticomunista em Mirandela

31/10/75 - Bombas anticomunistas em Fafe e Vila Nova de Famalicão

02/11/75 - Violência anticomunista. Bombas em Chaves, em Lisboa e na Madeira.

03/11/75 - Terrorismo de Direita. Bomba em Lisboa contra viatura da Academia Militar.

05/11/75 - Violência anticomunista. Petardos em Águeda, Évora, Gaia, Porto e no Comando Naval dos Açores. Bombas contra sindicalistas no Porto e em Beja

06/11/75 - Bomba contra militante comunista em Valpaços.

14/11/75 - Bombas no Porto contra a Intersindical, a UEC e o Rádio Clube Português.

16/11/75 - Bombas em Melgaço e Matosinhos.

17/11/75 - Violência de Direita. Bomba em Coimbra contra militante da LCI. Assalto ao município de Alfândega da Fé.

18/11/75 - Terrorismo anticomunista. Bomba em Lisboa contra livraria do Diário de Notícias

27/11/75 - Bombas em Braga, Viana do Castelo e no Porto

30/11/75 - Bomba contra sede do PCP em Fafe

04/12/75 - Bomba contra sede do PCP em Vila Nova de Famalicão

23/12/75 - Bombas contra sedes do PCP em Freamunde e Póvoa do Varzim.

25/12/75 - Terrorismo anticomunista. Bomba contra livraria comunista em Vila Nova de Gaia.

02/01/76 - Rede bombista de direita. Assalto a centro de trabalho do PCP no Montijo. Começa a vaga de ataques da rede bombista de direita. Metralhada a livraria Vitor em Braga

07/01/76 - Rede bombista. Bomba na cooperativa árvores do Porto. Petardo no domicílio de militante do MDP na Póvoa do Varzim.

08/01/76 - Violência anticomunista. Petardo contra militante do PCP em Fafe. Bomba em carro de funcionário do IRA em Coruche. Bomba em Amarante contra autarca. Rajadas de metralhadora em Braga contra carro de turistas espanhóis

13/01/76 - Rebentam uma série de bombas contra militantes ou instalações ligadas aos comunistas em Rio Tinto, Porto e Monchique. Agredido militante do PS em Fátima

14/01/76 - Bombas em tabacaria e pastelaria no Porto

16/01/76 - Bombas em Montemor-o-Novo (contra PCP), Vila do Conde (sessão do MDP) e Évora (sede do PS). Petardos contra navio soviético em Leixões. Incidentes em Esposende (bomba contra autarca). Petardos contra casas de militantes de esquerda em Fafe

17/01/76 - Terrorismo anticomunista. Bomba contra militante do MDP em Santo Tirso. Outras bombas em Viseu, Viana do Castelo e Olhalvo.

19/01/76 - Petardo contra casa de militante do PCP em Bragança.

20/01/76 - Bomba contra sede do MES em Faro.

21/01/76 - Bombas da Direita. Rebentamentos em Mértola, Santo Tirso, Porto, Arruda dos Vinhos, Seia, Gouveia, Braga, Lisboa, S. Martinho do Porto e Braga.

29/01/76 Incêndio destrói sedes do MES, UDP, FSP e FEC na Covilhã. Seis atentados em Braga.

30/01/76 - Violência de Direita. Comandos CODECO assaltam instalações da Standard Eléctrica em Cascais.

03/02/76 - Assalto a sede do PCP em Mirandela. Os últimos dos centros comunistas ainda em funcionamento em Trás-os-Montes.

07/02/76 - Violência de direita. Bombas em Penalva do Castelo e Mangualde.

13/02/76 - Assalto a centro de trabalho do PCP em Mirandela.

15/02/76 - Assalto a centro de trabalho do PCP em Tortosendo.

12/03/76 - Dois elementos do PCP são espancados em Braga

15/03/76 - Granadas contra sede do PCP em Espinho.

03/04/76 - Morte do Padre Max da UDP na zona de Vila Real, por atentado bombista

29/04/76 - Suspensão do MD

"Foi só em Agosto de 1976 que os portugueses ficaram a conhecer os responsáveis por mais de 150 crimes de terrorismo. Era os homens da rede bombista. Que também tinham sido do MDLP.

Só em Julho de 1975 ocorreram 86 acções de violência contra centros de trabalho e dirigentes do partido (NDR. do PCP). Em Agosto, foram contabilizados 153 assaltos, dos quais 55 com destruição dos centros de trabalho do PCP, 25 do MDP/CDE, 39 fogos-postos, 15 bombas e dezenas de agressões.” Este movimento se afirmava apenas no plano da luta política, ainda que admitindo o recurso à violência para resistir à influência do PCP (...)”

“(NDR. em 1976) Um relatório da Polícia Judiciária Militar regista 453 acções terroristas (...)”

” (...)depois da independência de Angola, em 11 de Novembro, o MDLP e todas as outras organizações de extrema-direita como o ELP, e os Codeco, receberam uma boa fornada de gente habilitada em matéria de bombas. (...)”

“(...) partir desse momento da independência de Angola que nasceram algumas das ligações mais perigosas de que há memória na história contemporânea de Portugal, entre esses operacionais (...) e dirigentes de partidos políticos. Ramiro Moreira, (...) desempenhou as funções de chefe da segurança pessoal de Sá Carneiro e do PPD. Vasco Montez, chefe dos Codeco, (...) colaborou na segurança do PS. José Esteves, Luís Ramalho (...), entre outros, também dos Codeco, foram seguranças no CDS. Um deles chegou mesmo a ser "motorista pessoal" de Freitas do Amaral, (...)”

Notas Soltas retirado de 

http://www.correiomanha.pt/noticia.asp?idCanal=0&id=200633

Embora oficialmente desmantelado pelo General Spínola, em Abril de 1976, os operacionais do MDLP continuaram as suas acções...

Antigos integrantes do MDLP em roda livre, só em 1976, segundo a Polícia Judiciária Militar, fizeram 453 acções terroristas.

Em Abril de 76 foi assassinado à bomba o padre Maximiano, candidato da UDP, em Vila Real.”

“Uma bomba matou dois diplomatas na embaixada de Cuba.”

“Em 1 de Maio, um carro armadilhado matou uma mulher, junto ao centro de trabalho do PCP, na Avenida da Liberdade, em Lisboa.

LP. Spínola, no Rio de Janeiro, suspende a actividade do MDLP.

O MDLP, retirado de 

http://dossiers.publico.pt/25novembro/artigos_relacionados/rede_politica_mdlp.html

“Os financiadores do MDLP foram figuras ligadas à banca e à indústria no antigo regime, como António Champalimaud, Manuel Bullosa, Queirós Pereira e Miguel Quina. (...) A um outro nível, figuras como os industriais Ferreira Torres, (...)  Rui Castro Lopo, (...) o comendador Abílio Oliveira, de Santo Tirso, Valentim Loureiro, foram financiadores mais ligados às estruturas operacionais do movimento (...)”

“Os homens mais ligados à actividade ofensiva contra a esquerda em 1975 foram Alpoim Calvão, (...) Ramiro Moreira, chefe de segurança do então PPD, (...) e Manuel Macedo, industrial nortenho agora alvo de uma investigação da Polícia Judiciária por suspeitas de espionagem a favor da Indonésia (...)"

Mas no terreno misturava-se tudo: o MDLP era apoiado por um vasto leque de ex-agentes e oficiais da PIDE e da Legião Portuguesa (...)”

“(...) As relações com o CDS eram muito próximas, tal como com o PSD, por afinidades ideológicas, nessa altura já evidentes. (...)”

“A estrutura política do MDLP tinha, por assim dizer, três polos.

Um primeiro gravitava à volta das movimentações de António Spínola, (...) Um segundo núcleo era constituído pelo grupo operacional que tinha um enorme peso nas decisões e que vivia sobretudo das movimentações de Alpoim Calvão. Por fim, os homens que formavam um grupo político encarregado de pensar o programa do movimento e definir passos estratégicos. (...)”

“MDLP assumia no seu programa que, "numa primeira fase", pretendia "enquadrar e apoiar o povo português na sua luta contra a implantação em Portugal de qualquer regime totalitário". Foi durante esta fase que a organização recorreu a todos os meios para encurralar o PCP numa investida que, no limite, poderia culminar na ilegalização deste partido. (...)”

O silenciamento de Joaquim Ferreira Torres, financiador do MDLP, retirado de

http://www.correiomanha.pt/noticia.asp?idCanal=0&id=200633


“Joaquim (patriarca da família Ferreira Torres, irmão do truculento Avelino que até Outubro do ano passado presidiu à Câmara de Marco de Canaveses) era um próspero empresário (...)

Senhor de considerável fortuna, financiou a rede terrorista de direita que, nos tempos revolucionários após o 25 de Abril de 1974, pôs o Norte do País a ferro e fogo. O principal alvo era o Partido Comunista: dezenas de dirigentes sofreram espancamentos ou sobreviveram a atentados e centros de trabalho foram destruídos à bomba.

No centro desta espiral de violência, estava o Movimento Democrático de Libertação de Portugal (...)

O julgamento da rede bombista de extrema-direita acabou por ser anulado pelo Supremo Tribunal de Justiça e mandado repetir.

Joaquim Ferreira Torres aguardava em liberdade a repetição do julgamento. (...) tornou-se num perigo para os velhos companheiros: (...) Foi silenciado para sempre (...)

(...) uma brigada de homicídios da Polícia Judiciária do Porto chegou oficialmente ao local do crime – mas já lá tinha estado uma outra equipa da PJ. (...) destruíram pistas e semearam outras que se revelaram falsas.

Ainda assim, dois inspectores da Polícia Judiciária estiveram a um passo de desmascarar o autor do crime. (...) Perderam a vida em serviço, muito convenientemente, num desastre de automóvel, na estrada entre Viseu e Mangualde.

(...) Restou apenas a convicção dos investigadores: os culpados estiveram no funeral de Ferreira Torres – e apresentaram comovidos e de gravata preta os mais sentidos pêsames à família.

Entrevista a Alpoim Calvão, retirado de 

http://www.uc.pt/cd25a/wikka.php?wakka=eacalvao

“(...) Incendiaram-se as sedes, reagiu-se... Gerou-se assim uma vaga de fundo em que uns entravam pelo rés-do-chão e os outros, saiam a voar pelo primeiro andar. Mas em muitas sedes os comunistas defenderam-se a tiro de caçadeira... (...)

(...) Antes disso (NDR. O 25 de Novembro), podem dizer que fui eu que as mandou pôr (NDR. as bombas), a todas, que eu não desminto.
Termina aqui a série Verão Quente.

Não foi uma pesquisa exaustiva sobre os acontecimentos desse verão, nem tão pouco pretendeu ser imparcial. Apesar disso não pretendo, com os relatos objectivos e a cronologia real dos acontecimentos que aqui foram expostos, branquear da outra facção.

A ideia desta pequena pesquisa surgiu por uma frase que li algures onde se dizia que a Esquerda pretende apagar a história.
 
Esta série traduz-se no meu grito contra o branqueamento das acções da Direita nesse período; contra a impunidade dos autores morais e materiais desses crimes; contra a seleção da  nossa história contemporânea, realizada pelos partidos de Direita e Centro-Direita, todos eles de algum modo relacionados com o MDLP, que nos governaram desde então!


Muito ainda há por dizer.

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