Conheça Os deputados que são sócios de empresas privadas e
beneficiam de contratos públicos (clique na imagem para aceder aos casos de
cada deputado) Fernando Virgílio Macedo (PSD) Luís Montenegro (PSD) Ricardo
bexiga (PS) Luís Moreira Testa (PS) Renato Sampaio (PS) Paulo Rios de Oliveira
(PSD).
Investigação do Jornal Económico revela deputados com mais de
10% do capital de empresas que beneficiaram de adjudicações de entidades
públicas. Subcomissão de Ética reúne-se hoje para analisar casos.
Os deputados à Assembleia da
República (AR) podem trabalhar em simultâneo – como administradores,
consultores, advogados, etc. – para empresas que celebram contratos com
entidades públicas, mas não podem deter mais de 10% do capital social dessas
empresas. É uma das poucas restrições inscritas no Estatuto dos Deputados (ED).
No entanto, o Jornal Económico detetou oito casos em que os
deputados em causa (ver caixas) têm participações superiores a 10% em empresas
(ou sociedades de advogados) que firmaram contratos com entidades públicas, ao
mesmo tempo que exercem funções na AR. Com a agravante de serem contratos por
ajuste direto, sem concurso público.
Ao que acresce a revelação de que alguns dos deputados terão
omitido (nos registos de interesses) participações que detêm noutras empresas.
Questionado pelo Jornal Económico sobre estes oito casos, o
presidente da Subcomissão de Ética, Luís Marques Guedes (deputado do PSD),
informa que as situações vão ser averiguadas: “A Subcomissão de Ética, como lhe
compete, solicitou aos deputados visados os esclarecimentos necessários para
aferir das dúvidas que estão a ser colocadas.
Na sequência dessa aferição, a Subcomissão de Ética responderá
ao por si suscitado”.
Para João Paulo Batalha, porta-voz da Transparência e
Integridade, Associação Cívica (TIAC), estamos perante “um testemunho eloquente
da indiferença, até do desprezo, com que estes deputados encaram a conduta
ética dos titulares de cargos públicos e as leis referentes a
incompatibilidades e impedimentos. Infelizmente, a política em Portugal
tornou-se um terreno fértil para ‘políticos de negócios’ que, numa situação de
absoluta promiscuidade entre o interesse público e os seus interesses privados,
promovem negócios com o Estado para proveito próprio ou de amigos. E o abuso
desse poder público para benefício privado é a nossa definição de corrupção”.
Fernando Virgílio Macedo (PSD)
Luís Montenegro (PSD)
Ricardo bexiga (PS)
Luís Moreira Testa (PS)
Renato Sampaio (PS)
Paulo Rios de Oliveira (PSD)
Sociedades de advogados
Entre os oito casos assinalados, quatro envolvem a prática de advocacia:
Luís Montenegro, Paulo Rios de Oliveira e Ricardo Bexiga em sociedades de
advogados e Guilherme Silva em nome individual. Uma fonte próxima de Montenegro
explica que a Sousa Pinheiro & Montenegro é uma sociedade civil, à qual se
aplicam as normas da lei civil em detrimento das normas da lei comercial. Mais,
diz que a advocacia não funciona segundo a lógica das atividades de comércio e
indústria, referidas na norma do ED, pelo que não há impedimento. A mesma fonte
acrescenta que se trata de uma profissão liberal e regulamentada por leis
próprias, nomeadamente o Estatuto da Ordem dos Advogados que não estabelece
qualquer incompatibilidade ou impedimento para os deputados. Caberá à
Subcomissão de Ética avaliar se essa interpretação jurídica é ou não válida.
José rui cruz (PS)
Assumiu o mandato de deputado à AR em
Outubro de 2015, mas ainda assim continuou a desempenhar as funções de gerente
da empresa Frutas Cruz II Lda. até Abril de 2016. José Rui Cruz mantém 34% do
capital social dessa empresa, a qual tem 20 contratos por ajuste direto
registados no portal “Base”, perfazendo um valor global de cerca de 164 mil
euros. Três desses contratos (visando a “aquisição de produtos alimentares” e
totalizando cerca de 25 mil euros) foram celebrados entre Dezembro de 2015 e
Março de 2016, com a Guarda Nacional Republicana e duas escolas públicas,
quando o gerente e sócio da Frutas Cruz II Lda. era deputado ao mesmo tempo.
Questionado sobre estes dados, Cruz mostrou-se disposto a explicar a situação
mas acabou por não responder.
Fernando Virgílio Macedo (PSD)
Foi eleito deputado em 2011 e integrou o
Conselho de Administração da AR (até 2015), ao mesmo tempo que prosseguiu a
atividade de gerente da Virgílio Macedo SROC Unipessoal (VMSU). A empresa é
detida a 100% pelo deputado Fernando Virgílio Macedo e presta serviços de
auditoria, revisão legal de contas e consultoria. Desde que Macedo entrou no
Parlamento, a VMSU firmou dois contratos por ajuste direto (“aquisição de
serviços de auditoria externa”) com entidades públicas: o Município de Valongo
em 2014, por 25 mil euros, e o Município de Vila Nova de Gaia em 2013, por 58
mil euros.
Em 2015, o total de vendas faturado pela
VSMU foi de 122 mil euros. Outro dado a ter em conta (e omitido no registo de
interesses) é que Macedo tem uma participação de 33,33% na empresa Rodrigo,
Grégório & Associado SROC Lda., a qual já obteve sete ajustes diretos
(municípios de Chaves e Vila Nova de Gaia, entre outros), perfazendo um valor
de cerca de 168 mil euros, enquanto Macedo exerce o mandato de deputado. O
total de vendas desta empresa em 2015 cifrou-se em 455 mil euros. Confrontado
com estes factos, Macedo respondeu: “Perante as questões colocadas, já contatei
a Subcomissão de Ética para esclarecimento total e cabal das mesmas, sendo que,
na minha opinião, obviamente, não existiu qualquer incumprimento do Estatuto
dos Deputados.”
Luís Montenegro (PSD)
Está na AR desde 2002, é o atual líder
parlamentar do PSD e continua a exercer advocacia ao mesmo tempo, sendo
proprietário de 50% do capital social da Sousa Pinheiro & Montenegro. Entre
2014 e 2017, a firma de Montenegro obteve seis contratos por ajuste direto de
entidades públicas: quatro do Município de Espinho (presidido por Joaquim Pinto
Moreira, do PSD) e dois do Município de Vagos (presidido por Silvério Regalado,
do PSD), perfazendo um valor global de cerca de 188 mil euros. O contrato mais
recente foi assinado no dia 18 de Janeiro de 2017, visando a “aquisição de
serviços jurídicos e de contencioso” pelo Município de Espinho, por 36 mil
euros. Montenegro foi presidente da Assembleia Municipal de Espinho (2009-2013)
e vereador na Câmara Municipal de Espinho (1997-2001). Perante estes dados,
fonte próxima de Montenegro invoca que a Sousa Pinheiro & Montenegro é uma
sociedade civil e que a advocacia é uma profissão liberal que não funciona
segundo a lógica das atividades de comércio e indústria, pelo que o impedimento
previsto no ED não se aplica ao seu caso.
Ricardo bexiga (PS)
Tornou-se deputado em 2015, mantendo a
atividade paralela de advogado e administrador da firma Ricardo Bexiga,
Oliveira e Silva & Associados, na qual detém 60% do capital social. Em
Abril de 2016, a firma de Bexiga celebrou um contrato por ajuste direto com o
Município de Valongo, por 62 mil euros, visando a aquisição de “serviços de
advocacia e demais serviços de natureza jurídica”. Este já é o quarto contrato
(totalizando mais de 200 mil euros) que Bexiga obtém do Município de Valongo
desde que José Ribeiro, do PS, assumiu a presidência daquela autarquia em 2013.
Questionado sobre estes dados, Bexiga alegou que “as autarquias são as
entidades em que se organizam as comunidades locais, nada tendo a ver com o
aparelho do Estado, seja da administração direta, seja da administração
indireta e das respetivas pessoas coletivas públicas.” Pelo que “o impedimento
não tem aqui aplicação,“ concluiu o deputado. No entanto, a lei refere-se
explicitamente a “celebrar contratos com o Estado e outras pessoas coletivas de
direito público,“ onde se inserem as autarquias. Além da sociedade de advogados,
Bexiga também mantém uma participação de 2% na empresa Quaternaire Portugal.
Desde Outubro de 2015, quando Bexiga assumiu o mandato de deputado, a
Quaternaire Portugal já obteve 39 contratos por ajuste direto de entidades
públicas, faturando cerca de 1,35 milhões de euros.
Luís Moreira Testa (PS)
Ao ser eleito deputado em 2015, Luís
Moreira Testa declarou no registo de interesses que tem participações em duas
empresas: 33,3% da Up2Com e 21,18% da CCP e Associados. Contudo, não referiu
que o cônjuge (em comunhão de adquiridos), Maria Arménia Moreira Testa, detém
15,39% de uma outra empresa – Costa, Calado, Pina e Associados Lda. – que
celebrou um contrato por ajuste direto com o Município de Portel, em Julho de
2016 (quando Testa já era deputado), visando a “publicitação de eventos, feiras
e iniciativas”. O preço contratual foi de 2.400 euros. A Up2Com também tem dois
contratos por ajuste direto com entidades públicas, registados no portal
“Base”, mas são anteriores à entrada de Testa no Parlamento.
Renato Sampaio (PS)
É deputado à AR desde 1999 e no registo
de interesses declara apenas uma participação no capital social da empresa Nuno
Sampaio – Arquiteto Lda., detida em 15% pelo cônjuge, Maria Sampaio, e em 85%
pelo respetivo filho, Nuno Sampaio. Desde 2009, enquanto Renato Sampaio se
mantém na AR como deputado, a empresa Nuno Sampaio – Arquiteto Lda. já obteve
15 contratos por ajuste direto de entidades públicas (Parque Escolar,
Administração Regional de Saúde do Norte, Município de Castelo Branco, etc.),
faturando um valor global superior a 716 mil euros. O contrato mais recente foi
celebrado no dia 23 de Janeiro de 2017, com o Instituto Politécnico do Porto,
visando a aquisição de “serviços de elaboração do projeto da residência de
estudantes” por 71.200 euros. O mais avultado remonta a Março de 2010, quando a
Parque Escolar adjudicou a “elaboração do projeto de arquitetura” de uma escola
em Castelo de Paiva por mais de 204 mil euros, sem realizar um concurso
público. Por outro lado, Renato Sampaio detém 49,90% da empresa Muro –
Sociedade de Construções, mas terá omitido esse dado no registo de interesses.
Paulo Rios de Oliveira (PSD)
Deputado à AR desde 2011, em acumulação
com as atividades profissionais de advogado e consultor jurídico, Paulo Rios de
Oliveira detém 45% do capital social da Rios, Pinho & Cristo, sociedade de
advogados que obteve dois contratos por ajuste direto da União das Freguesias
de Lordelo do Ouro e Massarelos, em Setembro de 2015 e Janeiro de 2016 (com
Oliveira em plenas funções na AR), por cerca de 14 mil euros. Objeto dos contratos:
“Aquisição de serviços de consulta jurídica, elaboração de documentos,
contratos ou protocolos de natureza jurídica.” Oliveira também possui
participações em duas sociedades imobiliárias (28% da Rent 4 You e 100% da
Green Leaves) que não estão inscritas no seu registo de interesses. Importa
salientar que Oliveira é membro da Subcomissão de Ética e da Comissão Eventual
para o Reforço da Transparência no Exercício de Funções Públicas. Questionado
sobre estes factos, o deputado não respondeu.
Guilherme Silva (PSD)
Foi deputado à AR durante 28 anos, entre
1987 e 2015, mantendo a atividade paralela de advogado. Nos últimos seis anos
em que esteve na AR, de 2009 a 2015, Guilherme Silva obteve 25 contratos por
ajuste direto de entidades públicas (Vice-Presidência do Governo Regional da
Madeira, Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, Universidade da
Madeira, Estradas da Madeira, etc.), faturando um valor global de cerca de 638
mil euros. Quase todos os contratos visaram a aquisição de serviços de
consultoria jurídica, representação jurídica ou elaboração de pareceres
jurídicos. O mais dispendioso foi celebrado em Abril de 2014 com a Secretaria
Regional do Plano e Finanças, por mais de 170 mil euros.
Sem comentários:
Enviar um comentário