Jaime Marta
Soares vai partilhar com PJ as suas suspeitas quanto a “mão criminosa”
Presidente da Liga dos Bombeiros não quer revelar mais dados até
ser ouvido pela Polícia Judiciária.
O presidente da Liga dos Bombeiros
Portugueses, Jaime Marta Soares, não recua uma vírgula nas suas declarações
desta manhã quando, no fórum da TSF, aventou a hipótese de o
incêndio de Pedrógão Grande ter tido “mão criminosa”. “Saúdo a abertura
de um inquérito por parte da Polícia Judiciária e guardarei as razões da minha
suspeita para o momento em que for ouvido”, declarou na tarde desta
quarta-feira ao PÚBLICO.
Cartéis,
esquemas e estado dos helicópteros. Os "negócios do fogo" revelados
nesta entrevista
O
negócio do fogo Como em todos os crimes económicos, há que seguir o dinheiro.
Assim,
urge perceber o negócio do fogo. Quem lucra com os incêndios? Estamos a falar
de muito dinheiro.
Uma aeronave a combater os incêndios custa
pelo menos 35 mil euros por hora. Nos últimos dois meses, tendo em conta os
meios aéreos envolvidos, dá para perceber os milhões envolvidos. Temos de saber
quem lucra com a venda de fardas, mangueiras e demais equipamento e temos de
saber quem lucra com a compra da madeira ardida. Se conseguirmos perceber isso,
talvez consigamos perceber a quem interessa pôr o país a arder. Há que seguir o
rasto do dinheiro.
O “NEGÓCIO” DOS INCÊNDIOS EM PORTUGAL
Pelo interesse que ultimamente tem
suscitado o artigo "MDN, MAI, Incêndios e Asneiras Escusadas" volto a
publicar um outro escrito em Agosto 2004 (publicado no "Expresso" um
ano depois...) sobre o mesmo tema.
Ambos os artigos não esgotam o tema e alguns aspectos apontados há quase
10 anos, já se tentou corrigir.
É lamentável que não se consiga resolver, em Portugal, um único problema
grave...
O “NEGÓCIO” DOS INCÊNDIOS
“Digo-vos – pois estes calam e nenhum não fala – que quero eu falar por
mim e por eles”.
Um escudeiro a Gonçalves Vasques
Crónica de D. João I, por Fernão Lopes
Se a quantidade de água lançada sobre os fogos fosse equivalente à
torrente de palavras, artigos, entrevistas e acções mediáticas que sobre a
temática em questão já foram ditas, escritas e efectuadas, certamente que
viveríamos sem labaredas na próxima década. O problema é que às palavras da
boca para fora não se seguem as acções adequadas.
Com isto dito pareceria sensato abster-nos de verter no papel uma
qualquer outra verborreia. E no entanto é isso que fazemos. A razão é simples:
pensamos que apesar de tudo o que tem sido dito, 90% aplica-se a efeitos e não
a causas e por isso não há soluções que resultem.
E, demos conta, que no fim de três décadas em que passou a haver
incêndios a eito (eis a primeira reflexão a ter em conta!), só o ano passado
houve a coragem de pôr o dedo nalgumas feridas.
Devemos começar por referir algumas evidências:
Desde sempre que houve florestas; desde sempre que houve pessoas – e o
seu grau de educação sempre tem evoluído; sempre houve pirómanos e
desequilibrados; sempre houve calor e outros fenómenos meteorológicos
propiciadores a fogos; as preocupações com o ambiente têm aumentado (e bem)
exponencialmente; os meios tecnológicos à disposição são cada vez mais e
melhores, etc.; tem havido tudo isto, mas o número de incêndios
florestais (é desses que estamos a tratar), não cessa de aumentar!
Outra constatação é que se trata de um fenómeno complexo e
interdisciplinar (e por isso interministerial) e é tendo isto em conta que deve
ser tratado. Aparentemente as investigações feitas a nível da Polícia Judiciária, não revelaram até agora
nenhuma teia de nexos. Provavelmente a razão está no que dissemos atrás: não
haverá apenas uma “teia”, mas várias...
Julgamos que a principal razão que leva a este aumento de fogos, cuja
esmagadora maioria vem a público como tendo origem criminosa – embora sempre
difusa – tem a ver com “negócios” a que se convencionou chamar “o
negócio do fogo”, ou “a indústria do fogo”. Ou seja, quanto mais
dinheiro o governo anunciar que vai injectar no combate aos fogos, mais fogos
irá haver...
Sem querermos referir dados concretos iremos dissertar sobre algumas
áreas onde o “negócio” do fogo pode ter lugar e noutras onde o “combate” não se
está a fazer com a desejada eficácia. O assunto é melindroso, mas tem de ser
tratado. Não se pretende lançar acusações ou generalizar, mas é preciso “podar
os ramos podres” para não matar a árvore. A pergunta tem que ser posta e é esta: a quem interessará o
fogo?
Eis algumas hipóteses sem preocupação de
hierarquia:
- Ao “negócio” da compra e venda da madeira; a madeira queimada é mais
barata, dá lucros a curto prazo, mas é suicidária a longo prazo;
- Às celulosas, no sentido em que poderão
querer promover a substituição do coberto vegetal por outro de crescimento mais
rápido e melhor para o negócio do papel;
- À especulação imobiliária, no sentido de favorecer o “negócio” da
compra e venda de propriedades;
- Ao “negócio” da caça privada versus caça pública, atente-se às
polémicas havidas;
- Ao “negócio” das indústrias relacionadas com o combate a fogos,
viaturas, equipamentos diversos, extintores, compostos químicos, etc., alguns
dos quais estão relacionados com elementos da própria estrutura de comando de
bombeiros (como chegou a vir a público no ano transacto);
- Ao “negócio” dos meios aéreos para combate a incêndios. Este negócio
disparou nos últimos anos. Até ao governo do Engenheiro Guterres a maioria dos
meios aéreos envolvidos pertencia à Força Aérea (FA), que tinha gasto nos anos
80, cerca de 200.000 contos em equipamentos.
Nessa altura, cremos que em 1997, o Secretário de Estado Armando Vara
entendeu (vá-se lá saber porquê!)[1] , que não competia à FA intervir nos
incêndios mas sim que deveriam ser contratadas empresas civis. Compreende-se
mal esta atitude a não ser pela sanha existente por parte da maioria dos
políticos em menorizar os militares e as Forças Armadas. Certo é, também, que a
FA não paga comissões.
No meio disto tudo – o que acresce à complexidade - há um sem número de
hipóteses de mão criminosa que passa por vinganças pessoais; as consequências
da última lei sobre baldios; queimadas mal feitas ou ilegais; pirómanos (e
alguns irão porventura parar aos bombeiros), questões derivadas de heranças e
os eternos descuidos e negligências.
Os investigadores têm, como podem os leitores aperceber-se, muito por
onde se entreter...
No campo da prevenção e combate tem reinado a confusão, o “complexo de
quinta” e a inadequação.
Nesta última encontram-se as leis e o processo de as aplicar e julgar.
Falar sobre isto exigiria um tratado. Em síntese as competências entre
Ministério Público, Tribunais e Polícias tem provado nas últimas décadas ser de
uma grande ineficiência e fonte de problemas; o Código Penal e o Código de
Processo Penal favorecem os criminosos, castigam o cidadão honesto e prejudicam
o trabalho da polícia e, a montante de tudo isto e envolvendo-o como um
espartilho, existe uma contumaz subversão da autoridade.
Ora urge fazer leis que ponham regras à venda de madeira queimada; no
plantio de coberto vegetal; à obrigatoriedade da limpeza das matas e abertura
de aceiros; à proibição de qualquer tipo de construção em área ardida durante
“x” anos; à equidade na distribuição de terrenos destinados à caça e mais um
sem número de coisas relacionadas com esta questão. E, claro, é necessário
expeditar a constituição e resolução de processos e julgar e penalizar todo o
indivíduo ou organização que tenha cometido um ilícito. E de não os soltar logo
a seguir.
A estrutura da protecção civil que coordena o combate aos incêndios
prima sobretudo pela falta de clareza. Isto é, não estão devidamente atribuídas
responsabilidades de comando de que resulta uma evidente dificuldade na
atribuição de meios e prioridades e no apuramento de responsabilidades. Para
melhorar esta área torna-se necessário combater o “complexo de quinta” (muito
arreigado!) e arranjar uma estrutura com comando centralizado e execução
descentralizada; estabelecimento eventual de níveis diferenciados de decisão e
linhas claras de autoridade. O afastamento dos militares de toda esta estrutura
foi um erro crasso que após a debacle do ano de 2003, já foi parcialmente
corrigido.
Temos a seguir o problema dos bombeiros. Os bombeiros sendo os “soldados
da paz” (parece que só se pode criticar os soldados da “guerra”...), pelos
serviços prestados e pela maioria ser voluntária goza de natural prestígio em
toda a população. E têm estado até há pouco acima de qualquer crítica. Ninguém
nem nenhuma corporação devem estar acima de qualquer crítica. O Estado tem-se
valido do elevado número de corporações voluntárias para poupar nos sapadores,
profissionais. Ora as exigências da sociedade actual não se compadecem com este
estado de coisas. Acresce que qualquer pessoa pode ser “comandante” de um
quartel de bombeiros voluntários e que a instrução e disponibilidade deixam
muito a desejar. Basta aliás olhar para o fardamento e atavio para se duvidar
da operacionalidade existente. Há pois que impôr alguma ordem neste estado de
coisas.
Finalmente os meios aéreos. Somos de opinião que os meios de combate a
incêndios devem estar na FA. Só quando estes forem insuficientes se devem
alugar outros. Haverá apenas que compatibilizar as exigências e sazonalidade
desses meios com as condicionantes operacionais e de dispositivo militar. Mas
isso não parece ser obstáculo intransponível. Acordos de cooperação entre
países amigos poderão e deverão ser feitos para optimizar os recursos.
Os incêndios são a todos os títulos uma calamidade para Portugal que se
repetem numa cadência previsível.
Por isso não se entende o descaso, a incompetência e a falta de vontade
política que os sucessivos governos têm demonstrado face a tão gravosa
situação. Parece que criámos um sistema político e uma sociedade que convive
com todos os problemas e tolera todos os vícios. E não resolve nenhum.
IN Novoadamastor.blogspot.pt
Leia também: A lamentável verdade
dos fogos em Portugal
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