O material de guerra roubado
da base de Tancos tem aquecido, e de que maneira, o debate político logo no
início do período de férias
do primeiro-ministro. O assalto - cujo Chefe do Estado Maior do
Exército, o general Rovisco Duarte, terá já admitido a responsabilidade,
levou à exoneração de cinco comandantes responsáveis. Sobre o caso, muito já
foi dito e criticado, com o Exército a ficar mal na fotografia.
Porém, aquilo que até agora tem sido sempre considerado um assalto, pode afinal
não o ser. É pelo menos essa a convicção do coronel Vasco Lourenço, para quem o
suposto assalto a Tancos pode ter sido encenado e fazer parte de um plano
político orquestrado para derrubar o Governo.
Por
que razão considera que o assalto Tancos foi encenado?
Tudo aquilo que se conhece aponta para não tenha havido um
assalto... não houve confronto, não houve violência. Não é credível que aquilo
se tenha passado, por exemplo, como o Expresso contou em que só faltou pôr o
vídeo da filmagem do assalto.
Aquela reconstituição, só para um indivíduo que não conheça
nada... Das duas uma, ou o jornalista que fez aquele artigo tem ligação direta
com os assaltantes e soube como as coisas se fizeram e contaram-lhe, ou então é
invenção pura. De facto podemos estar perante uma simulação de assalto. Não há
condições para que aquilo se tenha passado assim. Houve um furto do material ao
longo dos tempos. Ao longo de quanto tempo? É a questão que levanto.
Além disso, qual é a razão para que se denunciasse isso numa
altura destas? Uma das coisas que é preciso saber é se estava previsto haver
alguma inspeção aos paióis que implicasse uma conferência de material. Se
estava previsto fica clara a justificação do ser agora. Se não estava previsto,
bom, há que perguntar quem é que espoletou isto, nesta altura.
A ser como eu acredito que tenha sido, é evidente que não tenho
garantias que as ilações que estou a fazer sejam corretas - nada
garante que esta hipótese que levanto corresponda àquilo que se passou, mas é a
hipótese lógica de análise relativa à situação - é preciso saber quem
provocou o acerto de cargas. Isto é, foi quem entretanto fez o furto durante
algum tempo?
Há outra hipótese que começa a ser colocada, acontece muitas
vezes, o material é consumido de forma normal, de forma lícita, em instrução,
por exemplo. Mas consome-se nalgumas instruções mais material do que estava
previsto, depois não se justifica logo, o material é antigo e não se vai dando
importância a isso e mais tarde há-de resolver-se. Tudo aponta para que se
trate de material que estava obsoleto, algum dele estava para ser 'abatido à
carga', ser abatido e deixar de constar nos registos de existências.
É possível que se tenha passado assim. Se foi assim, a que nível
de comando é que isso se passou? O comando máximo da unidade que controla isso,
ou um elemento intermédio na linha de comando que é responsável pelo material e
que de repente sente que tem de prestar contas e não tem condições para tal?
São suposições que se podem fazer e que não são de todo inverosímeis.
Os militares não vão pedir ao poder político para ser ele a fazer a segurança das suas unidades e instalações
Em todo o caso, há responsabilidades militares no que se passou?
Com certeza. Há sempre alguma responsabilidade militar. E é
evidente que, por muitas razões de queixa que efetivamente são legítimas, que
as Forças Armadas (FA) tenham da tutela, do poder político que tem
desinvestido, que não tem dado importância às FA que devia dar, o ato concreto
em si tem de ser da responsabilidade da estrutura militar.
Os militares não vão pedir ao poder político para ser ele a
fazer a segurança das suas unidades e instalações. Mas é evidente que é
necessário que o poder político aproveite isto para ver que efetivamente tem
tratado muito mal as Forças Armadas enquanto instituição que se justifica que
fosse melhor tratada.
A vontade
de destruir a solução que está a vigorar em Portugal é muito forte e tem forças
internacionais envolvidas
A ter acontecido como acredita que tenha sido, tudo encenado para
atingir o Governo, o ministro da Defesa é então um alvo fraco a abater?
Eu direi que o problema não é o ministro da Defesa mas sim o
Governo. Sabemos também a capacidade que determinadas organizações e
determinadas forças têm em criar incidentes deste tipo. Sabemos isso. Não me
custa nada admitir que tenha sido uma organização mais sofisticada a organizar
isto, a provocar esta situação. Há uma coisa que é inevitável, a vontade de
destruir a solução que está a vigorar em Portugal é muito forte e tem forças
internacionais envolvidas.
Pergunto-me
como é que é um jornal de 'vão de escada' [El Español] que acaba por
trazer a notícia da listagem completa do material desaparecido.
Espanholas?
Eu pergunto-me como é que é um jornal de 'vão de escada' [El
Español] que acaba por trazer a notícia da listagem completa do material
desaparecido. É esquisito, não é? É o mesmo jornal que também noticiou que os
portugueses não tinham aceitado a oferta dos bombeiros espanhóis para nos
auxiliar no fogo [de Pedrógão Grande]. Tudo isto nos obriga a pensar que pode
haver aqui mãozinha de serviços de informação, etc., etc.
Tudo
por motivos políticos?
Sim, sim. Inclusivamente a natureza do material não tem o mínimo
interesse, ou tem muito pouco interesse, em termos de valor comercial. Acha que
se justifica o risco que, apesar de tudo, um assalto daquela natureza
provocaria por esse valor [34 mil euros]?
Se
chegassem com esse material aos terroristas, eles riam-se.
Afasta então a hipótese de o material ter entrado no mercado negro
e ter sido vendido a terroristas?
Se chegassem com esse material aos terroristas, eles riam-se.
[Os terroristas] têm material muito mais sofisticado e possibilidades de o
comprarem, porque não falta quem lho venda. Tudo isto é absolutamente ridículo
na minha opinião.
Até
que ponto saberemos a verdade sobre aquilo que aconteceu?
É uma boa questão que coloca, mas nós sabemos que muitas vezes
estas coisas acabam por ficar, não diria no tinteiro, mas... De facto, sabemos
que muitas vezes não chega a averiguações. Vamos ver. Tenhamos confiança que se
saiba e que não seja só daqui a uma quantidade de anos grande e que sejam
abertos determinados arquivos se possa saber o que é que se passou.
Considero
que o ministro nunca devia ter lá chegado, mas isso não significa que seja
agora por isto que vá ser demitido.
O
ministro da Defesa devia pedir a demissão como tantos têm pedido, sobretudo o
CDS?
Não, por esta razão não. Como também não vejo razão que
justifique demissão da ministra da Administração Interna por causa dos
incêndios. Qualquer dia estão a acusar o Governo de ter sido ele a fazer os
incêndios.
Vejo razão pelos procedimentos que tem havido nos últimos tempos nas Forças
Armadas, sou extremamente crítico em relação a tudo isso. É evidente que
considero que o ministro já não devia lá estar há muito tempo, ou melhor, nunca
devia ter lá chegado, mas isso não significa que seja agora por isto que deva
ser demitido. A acontecer estaríamos a dar razão, dentro da minha teoria, aos
que estão a procurar destruir o Governo.
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